domingo, 13 de dezembro de 2009

Jesus de Nazaré provavelmente Poeta (II)



Jesus entre os Poetas

Se Jesus de Nazaré deu forma escrita ao sistema moral que divulgou em ministério itinerante, se na arquitectura de um poema construiu um Reino de Justiça, Beleza como a humanidade nunca conheceu, se deu contornos poéticos a profecias e sonhos, se teceu cantos de alegria e louvor às maravilhas do mundo natural, nada se conservou ou, tudo ainda está por descobrir. Os Manuscritos do Mar Morto, documentos preciosos que religiosos judeus esconderam nas grutas calcárias de Qumran, situadas entre Jerusalém e o Mar Morto, só em 1947 foram encontrados. Uma década de escavações proporcionou a descoberta de mais de 800 papiros e fragmentos de pergaminho, escondidos durante cerca de dezanove séculos.


Porém, para descobrir um poeta em Jesus de Nazaré, importa menos valorizar a fecundidade conotativa das metáforas, das valências simbólicas, dos duplos sentidos, das significações plurais que brotam dos seus ensinamentos, do que considerar a preocupação que manifesta pelos desprotegidos, a coragem que mostra quando aperfeiçoa o património espiritual que recebeu, a singularidade das atitudes que tomou. Deste imenso universo, sobressai a simplicidade na escolha dos discípulos mais íntimos. Dispensando currículos e entrevistas, passa, observa, escolhe e diz ao eleito: Deixa tudo vem e segue-me. A sugestão que dá a quem oferece banquetes é ousada: convida os pobres, os aleijados os cegos, os mancos. O conselho dirigido ao jovem cheio de qualidades que deseja ser ainda mais puro, é irrealizável: Vende tudo o que tens, dá aos pobres e segue-me. A lei que acrescenta ao decálogo e que ainda está por cumprir: Amai-vos uns aos outros.


Ora sendo a poesia uma longa aventura da imaginação do Homem qual é o seu valor absoluto? Onde reside grandeza de um poema? Que pensam os poetas do engenho que possuem? Neruda, no livro CONFESSO QUE VIVI escrito mesmo no resto dos seus dias, informa que o amor e a Natureza são os alicerces da poesia que escreveu e acrescenta: Coube-me sofrer e lutar, amar e cantar. Tocaram-me na partilha do mundo triunfo e derrota, provei o gosto do pão e do sangue. Que mais quer um poeta? Depois, narra curioso episódio, que elege como o maior prémio obtido em toda a sua vida, maior que o Prémio Nobel que recebeu em 1971. Passa-se no vale de Lota, porto do Chile central. Um mineiro de face alterada pela dureza do trabalho, olhos avermelhados da poeira, sai de uma cova aberta na escarpa como se emergisse do inferno, vê o poeta, estende-lhe a mão calejada e diz: Conhecia-te desde há muito tempo irmão. Neruda, comovido, comenta as palavras e o gesto do mineiro: o vento e a noite e as estrelas do Chile disseram-lhe muitas vezes: Não estás sozinho; há um poeta que pensa nas tuas dores. O poeta sabe com quantas dores se tece a vida humana.


Quais serão os alicerces da oralidade do Mestre Nazareno? Um dia, deslumbrado, olha os lírios do campo, outro dia diz para um conjunto de rostos onde a miséria se desenha: Olhai os lírios do campo como eles crescem; não trabalham nem fiam…nem mesmo Salomão em toda a sua vida se vestiu como qualquer deles. Um dia vai pelos caminhos, olha as aves que passam velo-zes e observa os pássaros que chilreiam nas árvores, outro dia rodeado de gente envolta numa aura de tristeza, gente que se resigna a viver sem sonhos, diz-lhes: Olhai para as aves do céu, não semeiam não ceifam, não juntam em celeiros e Deus as alimenta. Aos oprimidos, aos pobres, aos pacificadores, aos misericordiosos, aos que têm fome e sede de Justiça, promete que um dia serão fartos, consolados, serão chamados filhos de Deus, viverão num Reino, onde o cordeiro convive com o lobo. Quem o via e ouvia, levava-o na memória.

Sem comentários:

Enviar um comentário