Uma metáfora resulta da tensão entre dois termos, sendo por isso possível, obter um fecundo conjunto de combinações. Imitando um poeta persa, chamamos a Sintra, tal como ele chamou à Lua, o espelho do Tempo. A ideia de espelho atribui-lhe brilho e fragilidade, a ideia de Tempo, faz pensar que é muito antiga, carregada de história, de mitos, de poesia. Naturalmente, desta metáfora, decorre a questão: Que marcas, que imagens deste Tempo que é o nosso, mostrará o futuro?
O espírito de Sintra é frágil, raro, precioso. Transporta-nos à beira do êxtase, à paz sem palavras, mas é fácil pervertê-lo. Não assistimos ao seu desabrochar, mas estamos investidos da missão de favorecer a continuidade do desabrochamento. Não testemunhámos o afã dos habitantes de outrora, mas vivemos na terra que eles inventaram. O “archote” foi-nos confiado e, num presente que nada tem de plácido, está sempre algo para acontecer. Que projectos em gestão amadurecem? Que sonhos germinam?
O aroma selvagem dos bosques continuará a entrar pelas narinas e a chegar à alma, se os bosques existirem, o voo picado do falcão e as manobras que antecedem o pouso de uma águia serão espectáculo, se estes seres voadores percorrerem os ares, mulheres e homens amarão o pujante cenário natural e respeitá-lo-ão, se suas vidas não forem uma sequência monótona de injustiças e episódios falhados. Uma boa mulher cuja vida decorreu à sombra do Paço Real morreu sem o ter visitado. É preciso que a velha metáfora Sintra glorioso Éden se torne verdadeira, para a totalidade dos seus habitantes.
Sintra é o espaço ideal para abolir o Tempo, para viajar simultaneamente no sentido do passado e do futuro, do ser e do não ser. Respirava-se a frescura de tranquila manhã, num dia de encerramento do Paço da Vila. Olhávamos o monumento sentados num banco e, enquanto o corpo amolecia, rememoravam-se acontecimentos ali ocorridos. Eis que alguém começa a subir a escadaria. Abeirámo-nos para informar que o Paço estava encerrado, quando reconhecemos o visitante. Cabelos escorridos cortados a direito ao nível das orelhas, franja sobre a testa a um dedo de distância dos olhos expressivos e brejeiros, farta barba e, para culminar, sobre a camisa um belo e requintado colar, o mesmo da pintura que representa o casamento do Rei Venturoso com D. Leonor.
-Veio matar saudades a Sintra SENHOR DOM MANUEL? - Perguntámos.
- Venho a Sintra para meditar sobre o TEMPO - respondeu com naturalidade.
Íamos tentar colher pormenores sobre a meditação da real personagem, quando o ruído de um carro da G.N.R. que atravessava o largo, nos interrompeu. Os olhos ainda percorreram a escadaria mas… estava deserta. Em Sintra o sonho convive com a realidade.
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